Um bom médico nunca ficará sem trabalho

“Depois disso, não tem como voltar atrás. Você toma a pílula azul ━ a história termina, você acorda na sua…

“Depois disso, não tem como voltar atrás. Você toma a pílula azul a história termina, você acorda na sua cama e acredita no que quiser acreditar. Você toma a pílula vermelha – você fica no País das Maravilhas e eu te mostro até onde vai a toca do coelho. Lembre-se: tudo o que estou oferecendo é a verdade.”

 Morpheus, de Matrix

Muitos médicos se submetem a uma vida de esterilidade e entorpecimento uma vida em que os dias, meses e anos parecem todos iguais. Você olha adiante pensando: é isso? É para onde minha vida irá me levar? Menosprezado, subestimado, sobrecarregado por burocracias administrativas, uma engrenagem na roda corporativa essa é a minha vida no futuro previsível?

Esse foi o diálogo interno que passou pela minha cabeça há alguns anos, quando a dívida estudantil me sobrecarregou, e eu estava trabalhando mais para pagá-la, deixando-me com pouco tempo para mim mesmo. Minha vida era bem parecida com a que eu tinha na residência. De todo o dinheiro extra que eu estava ganhando, a maioria foi para o Tio Sam e Sallie Mae (Navient). Eu mencionei que estava trabalhando muito? Fins de semana, feriados, noites, etc. A vida deveria melhorar depois da residência não é?

Dizem que tempo é dinheiro. Isso é falso, pois dinheiro pode ser feito e a riqueza aumentar. O tempo, por outro lado, é passageiro. Cada respiração nos leva a um passo além do nascimento e em direção ao nosso inevitável fim. Essa percepção me atingiu com força e me levou a refletir profundamente sobre a minha situação. Eu estava em uma encruzilhada e tinha uma decisão a tomar. Eu poderia tomar a pílula azul e continuar vivendo uma vida desinteressante e não realizada. Ou eu poderia sair da matrix e tentar algo diferente. Mas como?

Primeiro precisei de tempo para pensar. Meu horário de trabalho não permitia muito tempo para reflexão. Como mencionei, além do meu trabalho em tempo integral, estava trabalhando em plantões para pagar meus empréstimos estudantis. Foi então que notei algo interessante: estava ganhando mais dinheiro nos plantões do que em um mês como empregado.

Depois de fazer plantões por vários meses, claramente não fazia sentido continuar como empregado. Eu amava o meu trabalho, mas a falta de flexibilidade e tempo para buscar outros interesses fora da medicina me forçou a tomar a decisão de dar meu aviso prévio de 90 dias. Uns pensaram que eu fui louco, enquanto outros disseram que eu fui corajoso por me aventurar em território desconhecido. Tanto quanto eu gostaria de acreditar nos últimos, a verdade é que foi muito fácil.

Uma das melhores coisas em ser médico é que há uma demanda extremamente alta por nossos serviços. Essencialmente, um bom médico nunca ficará sem trabalho. Isso não vale para outras profissões, como meus amigos não-médicos gostam de me lembrar. Deixar um trabalho em tempo integral e fazer plantões talvez seja uma das apostas mais seguras que alguém pode fazer. É semelhante à diversificação do portfólio de investimentos. Em vez de investir todo o seu tempo e energia em uma única oportunidade, você está espalhando seu risco sobre várias delas.

Depois de reduzir significativamente meus plantões e agora ter total autonomia sobre minha agenda, tive tempo para refletir.

Graduação, faculdade de medicina, e residência a jornada para se tornar um médico é tão exigente que você pode se perder nela. Você dedica quase todos os momentos para ler, estudar para os exames, ou se preparar para seu próximo estudo de caso. O que eu gostava de de fazer no meu tempo livre mesmo? Quais eram meus interesses antes de embarcar nessa jornada? Para ser sincero, eu havia esquecido. Eu não sabia porque eu sempre me concentrei em passar nos exames e alcançar o próximo marco que eu tinha que conhecer a mim mesmo novamente.

Randi Zuckerberg, ex-diretor do Facebook e irmã de Mark Zuckerberg, uma vez tuitou:

“O dilema do empreendedor: manter amizades. Construir uma grande companhia. Passar um tempo com a família. Ficar em forma. Dormir. Escolha 3.”

No mundo da medicina, isso pode ser ajustado um pouco:

“O dilema do médico: Manter amizades. Ser um grande médico. Passar um tempo com a família. Ficar em forma. Dormir. Escolha 3.”

Lembro-me de ler isso, e me impressionou porque sentia a mesma dificuldade como um estudante de medicina, como um residente, e como um jovem profissional.

Deixar minha posição de empregado e me tornar um médico plantonista, foi, de certa forma, tomar a pílula vermelha. Eu entrei no País das Maravilhas um mundo onde eu estava no comando e onde eu controlava meu destino. Eu poderia focar em mim mesmo novamente, como meus interesses, minhas paixões, meus sonhos e que marca eu queria deixar neste mundo.

Ali Chaudhary é um médico de emergência. Este artigo apareceu originalmente em Locum Guru.

Fonte: Kevin MD

Traduzido por: Marcelo Medina