Ajudar as pessoas com doenças pulmonares a conhecer seus direitos e ter acesso aos tratamentos na rede pública. Há alguns…
Ajudar as pessoas com doenças pulmonares a conhecer seus direitos e ter acesso aos tratamentos na rede pública. Há alguns anos, essa se tornou a meta de vida de Carla Comini. Tudo começou em 2014, quando sua irmã foi diagnosticada com câncer de pulmão. A partir daquele momento, ela começou uma jornada de 4 anos até a cura. Mas algum tempo depois, o câncer voltou, dessa vez no cérebro. Com o corpo já fragilizado, ela não resistiu e faleceu em 2019.
Ainda em 2014, o diagnóstico da irmã acendeu um alerta em Carla sobre sua própria saúde. Se a irmã, que havia fumado por pouco tempo, estava com câncer, Carla, que fumou por 30 anos, imaginou o pior. Aos 51 anos, foi procurar um pneumologista. A suspeita do médico foi de enfisema pulmonar leve e asma. Logo depois, a partir de mais exames, como uma ressonância magnética, o diagnóstico confirmado foi de Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), e Carla já deu início a tratamentos para evitar complicações.
Desde então, Carla passa por uma nova consulta a cada 6 meses para acompanhar o quadro de DPOC. Durante esses quase 10 anos, foi acompanhada por apenas uma médica, porém agora foi encaminhada para outro nível de atendimento. Ela conta que nunca notou os sintomas até entrar na menopausa. “Até minha irmã ser diagnosticada eu não tinha sintomas, não tinha falta de ar, minha vida era bem agitada, eu caminhava todos os dias e praticava atividade física. Eu tinha fases de tosse muito forte, mas não relacionava isso com algum problema, pensava que era uma consequência menor do cigarro. Não tinha noção de que poderia ser uma coisa complicada”, relembra.
Para Carla, a atividade física e a fé a ajudaram a encarar a doença com serenidade. Em 2021, entre a primeira e a segunda dose da vacina contra a covid-19, foi infectada com o coronavírus. Carla teve 35% do pulmão comprometido, não precisou ser internada, mas teve acompanhamento médico online. Aprendeu a fazer exercícios respiratórios e não teve sequela alguma no pulmão. “Antes da pandemia comecei a fazer natação para a parte respiratória, mas parei. Apenas no ano passado retomei atividades físicas e me sinto muito melhor. A ioga também ajuda muito a capacidade respiratória”, relata.
A família toda se envolveu nos tratamentos. Em 2016, o marido e o sogro de Carla montaram uma farmácia comunitária na Vila Guarani, em São Paulo. Eles vão atrás de medicação para fazer as doações, inclusive para outras farmácias comunitárias redistribuírem os medicamentos. Além de São Paulo, também fornecem para farmácias comunitárias de Piracicaba, Araraquara, São José dos Campos e até de Uberaba.
Foi a partir daí que a perspectiva de Carla se ampliou. Começou, assim, a luta de Carla Comini pelos direitos de pacientes com DPOC. “Comecei a trabalhar lá como voluntária e atender a muitos pacientes com diversos problemas, dentre eles a DPOC. Foi então que percebi o quanto minha irmã e eu somos privilegiadas por termos plano de saúde. Percebo que o acesso pelo SUS não é claro o suficiente. A burocracia é tão grande que poucos conseguem tratamentos. Minha maior meta hoje é tentar encurtar o caminho para as pessoas terem acesso aos tratamentos que nossos impostos podem dar através do SUS”, afirma.
Formada em publicidade e hotelaria, Carla nunca tinha atuado na área da saúde. Depois de mais de 8 anos na farmácia comunitária, acabou conhecendo muita coisa. Aliás, foi assim que ela descobriu que existem organizações que apoiam pacientes e acabou entrando em contato com a Abraf pela Central do Pulmão. Ela diz que muitas pessoas que chegam à farmácia comunitária têm grande dificuldade de conseguir os medicamentos, por serem caros. Mas o que observou é que o que costuma ser mais difícil é a demora para chegar ao diagnóstico de DPOC. “Porque demora para conseguir consulta, demora para fazer exame… O acesso das pessoas para saber que podem ter ajuda do governo para fazer o tratamento é demorado. É um sofrimento a falta de conhecimento, de informações fáceis, é tudo muito burocrático”, avalia.
Ela ressalta que muitas pessoas se sentem frustradas por não conseguirem acesso ao diagnóstico correto e à medicação, e muitas delas desconhecem o direito ao tratamento na rede pública, inclusive em centros de referência. Assim, a farmácia comunitária acaba sendo também um lugar onde pacientes e familiares recebem informações sobre seus direitos. “Hoje a minha razão de viver, razão pela qual eu me levanto todos os dias, é ajudar as pessoas a terem acesso à rede pública. As pessoas pagam impostos para serem atendidas, para que o valor seja revertido para a saúde. Essa é minha maior meta: ajudar as pessoas a chegarem nesse acesso, sem burocracia, com mais facilidade.”
A Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) é caracterizada por enfisema pulmonar e bronquite crônica, e está associada, principalmente, à exposição ao fumo, poluição, poeira e produtos químicos. Quando descobriu a DPOC, Carla ficou assustada porque não sabia do que se tratava. Imaginava que com um tratamento, o quadro iria regredir e ela ficaria curada. Quando entendeu que não seria bem assim, viu que precisava buscar qualidade de vida por meio de atividade física, principalmente reabilitação pulmonar.
A essa altura, ela já tinha parado de fumar havia cerca de 3 anos. “Eu ficava assustada achando que o cigarro me daria o câncer e eu não pensava que o enfisema pulmonar te tira a qualidade de vida. Hoje o que eu comento com as pessoas, principalmente com aquelas que fumam, é que não é o câncer o maior problema, o problema é você ter um enfisema mais forte e ter que andar com oxigênio, você vai perder a sua qualidade de vida”, comenta.
Carla espera que seu relato ajude outras pessoas a deixarem de fumar e ir atrás de exames para que possam diagnosticar cedo alguma doença pulmonar. A busca por qualidade de vida é parte da luta de Carla Comini pelos direitos de pacientes com DPOC. “Não é fácil, porque às vezes você para de fumar e vem a depressão. O que eu falo para as pessoas é que a qualidade de vida que se deve buscar é a atividade física, além de procurar profissionais de saúde para ter o diagnóstico e o tratamento adequado”, reforça.