O ano de 2022 foi marcado pelo desabastecimento de medicamentos para Hipertensão Arterial Pulmonar em várias regiões do país. Mas…
O ano de 2022 foi marcado pelo desabastecimento de medicamentos para Hipertensão Arterial Pulmonar em várias regiões do país. Mas o fim de ano traz a expectativa de atualização do o tratamento da doença no Sistema Único de Saúde (SUS). Quem conversou com a gente sobre esse cenário foi a dra. Veronica Amado, coordenadora da Comissão de Circulação Pulmonar da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT).
Veronica é uma das entrevistadas da série especial que a Abraf produziu com médicos especialistas para falar sobre as principais preocupações relacionadas aos cuidados das pessoas com Hipertensão Pulmonar, DPOC, Fibrose Pulmonar e Insuficiência Cardíaca.
Quais as atualizações mais recentes no tratamento da Hipertensão Arterial Pulmonar?
A Diretriz Europeia de Hipertensão Pulmonar é um documento amplo, detalhado e metodologicamente bem feito. Foi publicado em 2022 e trouxe novos conceitos diagnósticos e propostas de planejamento terapêutico para os pacientes. Provavelmente foi a publicação de maior impacto neste ano.
No cenário nacional, quais as principais necessidades dos pacientes de hipertensão pulmonar e das equipes de saúde dos centros de referência no que diz respeito ao tratamento?
É necessário que o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) seja atualizado e que falhas importantes, presentes no documento de 2014, sejam corrigidas. Espera-se que isso ocorra no início de 2023.
O ano de 2022 foi marcado por períodos longos de desabastecimento e interrupção do fornecimento das medicações vasodilatadoras pulmonares. Vários centros de referência para o tratamento de Hipertensão Pulmonar relataram falta, por meses, dos vasodilatadores para os seus pacientes. Especificamente no Distrito Federal, isso foi desastroso. Os pacientes do DF permaneceram praticamente todo o ano sem a Bosentana, um dos vasodilatadores pulmonares utilizados no tratamento da hipertensão arterial pulmonar, resultando em descompensação clínica dos pacientes, maior número de internações e mesmo a morte de algumas pessoas. Esperamos que isso seja corrigido de forma definitiva no ano de 2023.
Quais os principais desafios para 2023 quando falamos em tratamento da HAP no SUS? Há expectativa para que o PCDT de HAP seja, enfim, atualizado?
Sim, esperamos que o documento seja ajustado e publicado no início de 2023. Espera-se que com isso, seja regularizado o fluxo de medicações para todos os estados e o Distrito Federal.
Quais as demandas mais urgentes para que possamos oferecer um melhor cuidado a quem tem Hipertensão Pulmonar Tromboembólica Crônica (HPTEC)?
É urgente que seja discutido um PCDT para HPTEC. É necessário discutir um plano organizado de atendimento e cuidado para esses pacientes, considerando níveis de complexidade diferentes de centros de referência capacitados para realizar a tromboendarterectomia, angioplastia pulmonar e tratamento clínico. Para tanto, é de central importância a discussão sobre os valores referentes a esses procedimentos, hoje muito aquém do custo real.
Além disso, a única medicação comprovadamente benéfica para o tratamento dos pacientes com HPTEC, que não tenham indicação cirúrgica, não foi incorporada pela Conitec. Esse fato gera grande prejuízo para os pacientes, além do prejuízo econômico ao Estado brasileiro pela judicialização dessa medicação, o riociguat. Novamente fica claro a necessidade de rever a decisão da Conitec, assim como é evidente a importância da discussão do PCDT para essa enfermidade.
Ainda sobre a HPTEC: por que o acesso à cirurgia de tromboendarterectomia pulmonar ainda é difícil no Brasil?
Exatamente por se tratar de procedimento de alta complexidade, sugere-se que haja um centro que realize a cirurgia para cerca de 50 milhões de habitantes. Dessa forma, cinco centros no Brasil seriam suficientes. Nesse momento, já temos esse número de centros capacitados, o que precisamos é organizar a rede de atendimento, criando mecanismos que definam esses centros como referência e criando o fluxo de cuidado dos pacientes. Isso inclui o tratamento fora de domicílio, um sistema de referência e contrarreferência e a remuneração adequada para este procedimento.
O acesso a diagnóstico, tratamento e reabilitação pulmonar no Brasil é desigual. Como podemos buscar soluções que beneficiem os pacientes?
A educação continuada é fundamental para que se consiga melhorar a capacidade diagnóstica da hipertensão pulmonar. A capacidade de investigar adequadamente o sintoma mais frequente da HP, que é a dispneia (falta de ar), certamente permitirá que o diagnóstico seja feito corretamente e em menor tempo.
Ações conjuntas que permitam a orientação da atividade física de forma virtual, também poderão trazer benefícios, no que tange a reabilitação pulmonar, permitindo acesso para mais pessoas, com a adequada orientação profissional.
Qual outro desafio enfrentado para o tratamento de HAP?
Acredito que o transplante pulmonar é um grande desafio. Nos últimos anos, alguns centros mostraram grandes avanços nos resultados cirúrgicos para pacientes com HAP. Para que esse resultado melhore ainda mais e que esse procedimento seja possível para um número maior de pacientes, será importante a compreensão das especificidades e demandas relacionadas a essa condição clínica. Estabelecer quais centros são mais capacitados para realizar transplante, nessa população, é importante para o dimensionamento do atendimento e planejamento de encaminhamento dos pacientes de diferentes origens regionais.
Que mensagem gostaria de deixar às pessoas que vivem com hipertensão pulmonar no Brasil?
Os pacientes que têm HP apresentam limitações diárias para suas vidas. Além da doença, precisam lidar com as dificuldades da assistência em nosso país. Ainda assim, lutam por dias melhores e seguem em frente de cabeça erguida. Desejamos e trabalhamos para que, ano após ano, possamos propiciar um cuidado mais digno e uma qualidade de vida melhor para todas e todos eles.