ABRAF acompanha com preocupação julgamento do STF de casos que envolvem a judicialização de medicamentos não incorporados ao SUS

O Supremo Tribunal Federal (STF) analisa até esta sexta-feira (13/09) uma ação que trata do fornecimento de medicamentos pelo Sistema…

O Supremo Tribunal Federal (STF) analisa até esta sexta-feira (13/09) uma ação que trata do fornecimento de medicamentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em casos decididos pela Justiça. O julgamento do processo começou no dia 6, em sessão virtual.

O que está em julgamento é o Recurso Extraordinário (RE) 1366243, com repercussão geral reconhecida, dos temas 6 e 1234, cujo relator é o ministro Gilmar Mendes.

A ABRAF acompanha o julgamento com preocupação, pois a decisão pode restringir o acesso judicial a medicamentos aprovados pela Anvisa, mas que não estão incluídos no SUS.

Dessa forma, o julgamento representa um retrocesso na garantia do direito à saúde, especialmente para pessoas que vivem com doenças raras e graves, como a hipertensão pulmonar e a fibrose pulmonar idiopática.  A maior parte dos medicamentos para doenças raras são de alto custo.  Infelizmente, a judicialização é o único caminho para acesso a tratamentos que são fundamentais para a vida desses pacientes. Ora, o que fazer quando existe opção de tratamento aprovado pela Anvisa e o paciente está totalmente desassistido?

Abaixo, registramos algumas considerações, escritas com apoio e consultoria do escritório Malta Advogados, parceiro da ABRAF em ações de advocacy e relações governamentais.

 

Considerações breves a respeito dos REs 566.471/RN e 1.366.243/SC

(Temas 6 e 1.234 da Repercussão Geral do STF)

 

I. BREVE SÍNTESE DOS CASOS

O Supremo Tribunal Federal (STF) está julgando entre os dias 06/09/2024 e 13/09/2024, em sessão de julgamento virtual, dois casos emblemáticos que envolvem a judicialização de medicamentos não incorporados ao Sistema Único de Saúde (SUS), a saber, os Recursos Extraordinários (REs) 566.471/RN e 1.366.243/SC. Os julgamentos voltam-se, em especial, à fixação das teses do Tema 6 (RE 566.471/RN) e do Tema 1.234 (RE 1.366.243/SC), ambos da sistemática da repercussão geral.

Em suma, em relação à fixação da tese de julgamento relativa ao Tema 6 da repercussão geral, o que se busca é definir se e em quais condições o Poder Judiciário pode conceder medicamentos não incorporados ao SUS. Enquanto, em relação ao Tema 1.234, busca-se definir a competência, o custeio e o ressarcimento em demandas que envolvam medicamentos não incorporados ao SUS, entre eventuais outros critérios.

Tendo em vista que ambos os Temas da Repercussão Geral compartilham os mesmos problemas, entendeu-se essencial que a análise ocorresse de forma conjunta pelo Plenário da Suprema Corte, de modo a evitar soluções divergentes sobre matérias correlatas.

 

II. ALGUNS IMPACTOS QUE PODEM SER PREJUDICIAIS PARA PACIENTES COM A FIXAÇÃO DAS TESES PROPOSTAS AOS TEMAS 6 E 1.234

a. Impactos da Tese proposta ao Tema 1.234

Dentre as teses propostas no Tema 1.234, o principal impacto que pode ser prejudicial está na proposta de fixação da competência da Justiça Federal para julgar demandas sobre medicamentos registrados na Anvisa, mas não incorporados ao SUS, quando o valor do tratamento anual do fármaco ou do princípio ativo for igual ou superior ao valor de 210 salários-mínimos. Essa medida pode dificultar sobremaneira o acesso a esses medicamentos, sobretudo para pacientes que demandam tecnologias de alto custo, diante do risco de aumento da morosidade na Justiça Federal.

Outro impacto prejudicial e que merece atenção é o ônus probatório exigido do paciente, que será o autor da ação que pleiteia um medicamento não incorporado. A tese estabelece que o autor da ação é quem deve demonstrar a segurança e a eficácia do fármaco, com base na medicina baseada em evidências. Todavia, essa determinação não leva em conta que, para alguns pacientes, o requisito é extremamente difícil de cumprir, em razão da escassez de estudos científicos sobre determinadas tecnologias.

b. Impactos da Tese proposta ao Tema 6

As teses propostas no julgamento do Tema 6 têm mais pontos que causam preocupação, uma vez que se busca definir se e em quais condições o Poder Judiciário pode conceder medicamentos não incorporados ao SUS, algo que tem a possibilidade de causar maiores prejuízos aos pacientes.

Embora a regra geral proposta seja no sentido de que o Poder Judiciário não pode determinar que o SUS forneça medicamentos não incorporados, independente do seu custo, a Tese estabelece que, em caráter excepcional, o paciente poderá requerer judicialmente o fornecimento de fármaco que não consta das políticas do SUS, desde que cumpridos alguns requisitos cumulativos. No entanto, os critérios estabelecidos são excessivamente rígidos, o que pode ser bastante prejudicial para os pacientes.

Um dos pontos prejudiciais da tese é a necessidade de que o autor da ação demonstre eventual ilegalidade do ato de não incorporação do medicamento emitido pela Conitec, ausência de pedido de incorporação ou da mora na sua apreciação. Exigir que o paciente comprove que a não incorporação é ilegal ou, ainda, que há mora no processo de análise pelo órgão responsável pode resultar em um enorme desafio, em razão do ônus excessivamente rigoroso e técnico.

Nessa mesma toada, outro ponto que pode ser prejudicial é a necessidade de demonstração da impossibilidade de substituição por outro medicamento constante das listas do SUS e dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas (PCDTs). Isso, pois, não considera que cada paciente tem as suas próprias particularidades e que podem não responder adequadamente às terapias incorporadas ao SUS, limitando, portanto, o seu direito a tratamentos personalizados e específicos para o seu caso.

Por fim, é de se observar que a necessidade de o paciente ter de comprovar a imprescindibilidade clínica do tratamento, mediante laudo médico fundamentado, também pode ser potencialmente prejudicial aos pacientes. Isso, porque, pode-se criar um ônus ainda mais árduo para aqueles pacientes sem recursos financeiros ou sem acesso a especialistas, o que pode resultar na impossibilidade de obter documentação robusta, técnica e detalhada.

 

III. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de todo o exposto, observa-se que as teses propostas para os Temas 6 e 1.234, ambas da repercussão geral, estabelece critérios demasiadamente rígidos, com ônus probatório elevado, para a concessão de medicamentos não incorporados, o que, por sua vez, pode restringir o acesso a tratamentos que poderiam ser essenciais à preservação da saúde e da vida de diversos pacientes.

Ao tentar melhor disciplinar o problema da judicialização de medicamentos não incorporados ao Sistema Único de Saúde (SUS), ambas as teses podem resultar em obstáculos significativos para vários pacientes que desejam pleitear os medicamentos não incorporados na via judicial (como, por exemplo, os de alto custo), sobretudo os que estão em situações de vulnerabilidade ou enfrentando condições raras ou graves.

Por isso, é de se observar que as diversas barreiras impostas pelas teses têm o condão de comprometer severamente o exercício do direito constitucional à saúde.