A vida recomeça: conheça a história de Pietra, transplantada aos 4 anos de idade

A pequena Pietra Guedes Stefanin, aos 4 anos, já tem muita história para contar. Em fevereiro de 2025, ela recebeu…

A pequena Pietra Guedes Stefanin, aos 4 anos, já tem muita história para contar. Em fevereiro de 2025, ela recebeu o primeiro transplante bilateral de pulmão realizado em uma criança tão jovem no Brasil.

Pietra e seus pais, Poliana e Orlando, estão no filme Respira Vida, idealizado e produzido pela Abraf e lançado em novembro de 2024. Na produção, contamos a história de Pietra desde os primeiros sintomas, passando pelo diagnóstico de hipertensão arterial pulmonar, o acesso a um centro de referência em São Paulo, até a espera por um novo pulmão na fila de transplante.

Um novo capítulo dessa história começou com a realização do transplante. Para marcar o Dia Mundial dos Transplantados, celebrado em 6 de junho, nós entrevistamos a mãe de Pietra, a Poliana Guedes Ferreira, que conta como está a recuperação da filha e deixa uma mensagem de esperança: “Se você está na fila de espera, mantenha a fé. O órgão vai chegar no momento certo. Os primeiros meses do pós-transplante exigem paciência, mas cada passo vale a pena quando se vê a vida recomeçando”.

Confira a entrevista completa.

Como foi receber a notícia de que o pulmão para o transplante da Pietra havia chegado?
Recebemos a notícia em uma segunda-feira chuvosa, no dia 10 de fevereiro de 2025, no fim da tarde. Fui em quem atendi o telefone. O pai da Pietra estava trabalhando em home office no quarto e, ao ouvir que a ligação era do InCor, logo imaginou do que se tratava.
Foi um momento de sentimentos mistos: surpresa, preocupação e, acima de tudo, esperança. Não esperávamos que acontecesse tão cedo. Havia o receio, já que seria o primeiro transplante bilateral de pulmão realizado em uma criança tão jovem no Brasil. Mas após dois anos e um mês de luta, a notícia reacendeu nossa fé: talvez agora, finalmente, Pietra pudesse ter uma vida plena.

Como foram os dias de recuperação no hospital?
Nos primeiros dias, o mais difícil era lidar com a saudade de ver a Pietra conversando e brincando. Sabíamos que seria uma jornada passo a passo: sair da ECMO, ser extubada, retirar os drenos, voltar a se alimentar pela boca… cada pequena conquista era uma vitória.
Os sedativos a deixaram sonolenta por dias. Ela perdeu peso, teve reações alérgicas e crises de abstinência enquanto as medicações iam sendo reduzidas. Ainda assim, vibrávamos com cada progresso: sair da REC (unidade de recuperação), depois da UTI, ir para o quarto e, por fim, respirar sem ajuda de cateter. Foram momentos que jamais esqueceremos.

Como está sendo a rotina de cuidados após a alta?
Atualmente, a Pietra passa por consultas quinzenais e realiza exames de sangue e raio-x previamente, para ajustar as medicações. Ainda toma muitos remédios diariamente e faz fisioterapia duas vezes por semana. As inalações foram suspensas apenas recentemente, quase quatro meses após o transplante.
Seguimos com cuidados rigorosos. Evitamos sair de casa e, quando saímos, é sempre de máscara. A boa notícia é que ela já recuperou o peso e consegue correr e brincar sem cansaço, algo impensável antes do transplante. Ainda assim, nos preservamos, especialmente por causa do surto de Influenza.


Quais os desafios dessa fase de recuperação?
Um dos maiores desafios nos primeiros dias em casa foi a alimentação. Pietra estava muito magra e com pouco apetite. Também enfrentamos dificuldades com a medicação ValGan, que causava enjoo. Com o tempo, ela foi se adaptando.
Outro desafio tem sido o transporte. Moramos perto do InCor, mas os exames e consultas geralmente acontecem em horários de pico. Como não podemos arriscar transportes públicos, dependemos de corridas de aplicativo, que muitas vezes são caras e demoradas devido ao trânsito de São Paulo.

Vocês estão morando em São Paulo?
Sim, nos mudamos para São Paulo em novembro de 2024, três meses antes do transplante, justamente para ficarmos mais próximos do InCor.
Essa decisão foi essencial. O pai pôde visitar a Pietra todos os dias, levando e buscando roupas. Já eu só voltei para casa nos três primeiros dias de internação, quando Pietra ainda estava na ECMO. Depois disso, permaneci no hospital ao lado da minha filha em todos os momentos.

Quais medicamentos a Pietra usava antes do transplante e quais ela usa agora?
Antes do transplante, Pietra usava: Iloprosta, Sildenafila, Bosentana e Atenolol. Após o transplante, passou a tomar: Omeprazol, Tracolimo, Micofenolato, Prednisolona, Sulfametoxazol, Furosemida, Carvedilol.
A suspensão das inalações com Iloprosta marcou simbolicamente o início de uma nova fase. Foram 1 ano e 7 meses com inalações frequentes, inclusive de madrugada. Ver seus lábios se recuperando do ressecamento e não ficar mais com rosto vermelho é mais um sinal de que tempos melhores chegaram.

Como você está se sentindo com tudo isso?
Os dois anos e um mês antes do transplante foram extremamente angustiantes. Vivíamos sempre em alerta, com medo de uma nova crise. No início, ela ainda frequentava a creche, mas depois tivemos que tirá-la. Viagens longas foram suspensas, e até o batizado foi adiado três vezes por conta das internações.
Foram muitos momentos de frustração. Pietra nunca foi à praia. Viajou uma única vez à Bahia, antes de completar um ano. Por conta dessa rotina, ela tem poucas amiguinhas. Porém, após o transplante, a angústia deu lugar ao alívio. A preocupação existe, claro, mas agora ela é diferente — mais leve, com esperança real de futuro.

Qual a importância de estar em contato com outras pessoas que vivem a HAP ou já passaram pelo transplante?
Essa rede de apoio foi fundamental. Além do suporte emocional, trocamos informações sobre medicamentos, reações e etapas da recuperação. Também ajudamos uns aos outros quando algum remédio está em falta em determinada região.
A Hipertensão Arterial Pulmonar (HAP) é uma doença pouco conhecida. Mesmo que a Pietra, após o transplante, teoricamente não conviva mais com ela, seguimos engajados em conscientizar outras famílias. É importante que mais pessoas conheçam os desafios dessa condição — desde o diagnóstico até a rotina de cuidados.

Que mensagem você deixaria para a comunidade da Abraf sobre doação de órgãos?
Se você está na fila de espera, mantenha a fé. O órgão vai chegar no momento certo. Os primeiros meses do pós-transplante exigem paciência, mas cada passo vale a pena quando se vê a vida recomeçando.
Se você é familiar ou apoiador da causa, continue espalhando a importância da doação. Doar não é torcer pela morte de alguém — é permitir que, mesmo diante da perda, outras vidas possam continuar. É transformar dor em esperança. E isso faz toda a diferença.

Saiba mais
O curta documental “Respira Vida” conta histórias de vida e superação de cinco pessoas que vivem com hipertensão pulmonar e suas famílias. Dirigido por Érica Amorim e produzido por Flávia Lima e Iara Machado, o filme tem como protagonistas: Pietra Guedes Stefanin, Marcello Antunes, Caio Vinicius de Oliveira, Carolina Batista Chechelaca e Maria do Carmo de Oliveira Souza.

A produção está disponível no youtube da Abraf.